Para que conste
Esta testemunha, como outras, afirma ter sido abusada por Paulo Pedroso (entre outros) na casa de Elvas de todas as vezes que lá foi.
Lei de Gresham (um ano depois)
FAZ este fim-de-semana um ano que foi publicado, neste mesmo jornal, um artigo, com o mesmo título, da autoria de Aníbal Cavaco Silva. Nesse mesmo fim-de-semana, a saída de um ministro precipitou a anunciada dissolução do Parlamento.
Falei de anunciada dissolução porque, no ano passado, desde que o meu Governo entrou em funções, era anunciado, quase dia-sim, dia-não que o Presidente da República dissolveria o Parlamento logo que ocorresse uma situação propícia, quadro que, naturalmente, incluiria a existência de sondagens favoráveis ao principal partido da oposição.
SÃO FACTOS. Limito-me a recordar que não era difícil existirem tais sondagens: Em primeiro lugar, as eleições europeias tinham ocorrido pouco tempo antes, com o pior resultado de sempre para os dois partidos que então estavam no Governo e dando a vitória ao Partido Socialista, liderado por Ferro Rodrigues;
Em segundo lugar, o meu Governo, ao contrário do actual, entrou em funções numa época do ano de começo de colocação de professores, de incêndios de Verão e de apresentação de Orçamento do Estado;
Em terceiro lugar, porque governávamos, como sempre deve ser, convictos de que teríamos tempo para aplicar o nosso programa, incluindo medidas, por todos reconhecidas como corajosas: lembram-se da Lei das Rendas, das taxas moderadoras diferenciadas, das portagens nas auto-estradas? Foi nesse quadro que foram convocadas eleições, ou seja, na pior altura possível para o Governo.
O Presidente da República teve pois o que era propalado como indispensável para tomar a decisão que anunciou quatro dias depois do referido artigo de Cavaco Silva e três dias depois da demissão do ministro. Essa decisão ocorreu faz na próxima quarta-feira um ano e é por isso que escrevo agora este artigo (não estando em causa, como é evidente a pessoa do Presidente da República, por quem sempre tive apreço).
Quero limitar-me a factos e à verdade objectiva, para aquele que é o propósito deste texto: saber se a decisão presidencial de há um ano, de dissolver o Parlamento, foi ou não boa para Portugal (e, portanto, que moeda substituiu que moeda).
A única maneira de o saber, sem subjectivismos, é ir à tal verdade dos factos e comparar o Portugal de há um ano, com o Portugal de hoje, não esquecendo, também, alguns argumentos do Presidente.
1 - Para não nos demorarmos muito nesses argumentos convém recordar que o principal teve a ver com «episódios». A esse respeito, dispenso-me de qualificar os factos conhecidos deste Governo, nomeadamente, a demissão do ministro das Finanças, as acumulações de reformas, as contradições entre membros do Governo, inclusive entre ministros e o primeiro-ministro a propósito de impostos, do Orçamento, aeroporto da Ota, de privatizações e de vários outros temas, dispensando-me também de realçar erros de contas, erros quanto a argumentos (como o número de médicos por hospital, etc.) e comunicados do gabinete do primeiro-ministro a fazer a interpretação das palavras do próprio. Nessa matéria estamos todos esclarecidos. Reconheço, apenas, que o ex-ministro das Finanças Campos e Cunha se demitiu de um modo diferente do ministro do meu Governo: da demissão de Campos e Cunha todos perceberam as razões de fundo, apesar de ele ter tido o carácter de não falar sobre elas, mesmo sendo verdadeiras e substanciais.
2 - Mas, voltando a questões substanciais, que são as que devem interessar, façamos a comparação, baseando-nos, além do que é público e de conhecimento generalizado, nos números do relatório de Outono do Banco de Portugal há poucos dias divulgado:
a)Há um ano o país tinha uma maioria coesa no apoio ao Governo; agora também tem. Aí não há diferença;
b)Há um ano a economia cresceu cerca de 1,3%, o que foi o maior crescimento desde 2001. Para este ano, o Banco de Portugal prevê um crescimento de 0,3% (o que, nas palavras de José Sócrates, há poucos anos, na RTP, corresponde a estagnação económica). Aqui, a diferença de cerca de 1% é para pior;
c)Há um ano o aumento do investimento conhecia o maior valor desde 2001: foi de 1%. Este ano será negativo. A diferença é para pior agora;
d)Há um ano as exportações tiveram o maior aumento desde 2001 inclusive: o aumento foi de 5.4 enquanto que este ano admite-se que chegue aos 0.7. A diferença é para pior agora;
e)Em
f)A balança corrente mais a balança de capital passou de -5,9% do PIB para -8.3% em 2005, o que demonstra que, mesmo o muito tímido crescimento é feito comprometendo-se ainda mais as contas externas. A diferença é agora para pior;
g)Mesmo falando na célebre questão do défice orçamental, o do ano passado foi de 2,9% conforme já reconhecido por todas as entidades nacionais e europeias. Sem receitas extraordinárias foi de 5,2%. Este ano já com o bónus das alterações no cálculo e também com o aumento do IVA, e segundo os próprios sem receitas extraordinárias (o que não é bem verdade) ficará em 6,2%. Aqui a diferença também é para pior agora;
h)O ano passado, ao contrário do que aconteceu com este Governo, não subiu o IVA, ajustaram-se os escalões do IRS e concretizou-se a baixa do IRC, decidida pelo Governo de Durão Barroso. Também aqui, para as pessoas e para as empresas a diferença é agora para pior;
i)Há um ano o desemprego era de cerca de 6,8% este ano já vai em 7,7% (comparação homóloga do 3º trimestre dos dois anos). Também aqui a diferença é agora para pior;
j)Há um ano a subscrição dos PPR era inferior em cerca de 80% ao que já se conhece deste ano, apesar de todas as críticas feitas às medidas que tomámos. Também aqui a diferença é agora para pior;
l)Em relação ao ano passado, apesar de ter sido menor o crescimento, aumentou na mesma o consumo privado e o endividamento das famílias. Aliás, o muito tímido crescimento da economia que está previsto baseou-se sobretudo nesses factores, agora tão pouco mencionados. Aqui também não houve diferença para melhor.
m)Quanto à capitalização da economia e para nos colocarmos mais do lado dos agentes económicos, o índice PSI da Bolsa de Lisboa subiu 27% em 2004. Este ano, até Outubro, tinha subido só 7%. Quanto pior é a diferença para agora.
Podia dar muitos mais exemplos em política interna e em política externa, mas talvez não seja necessário. Devo, porém, referir que esta evolução da economia não se dá num quadro de retracção da economia internacional. Não falando, obviamente, nos níveis de crescimento da China, de Angola nem de outros países da Europa Oriental (já membros da União Europeia), cito apenas o caso de Espanha, que cresce este ano cerca de 3,5% ou o da Grécia que crescerá perto disso. A economia americana, essa deverá crescer cerca de 4% e mesmo em Inglaterra o crescimento andará perto dos 2%. Ora, se é tão referida, e bem, a dependência da economia portuguesa de outras economias quando os números destas são negativos, percebe-se por que não se invoca agora esse mesmo argumento.
Criticava-se o meu Governo por falar em esperança, por falar em espírito positivo, por falar
Pode, pois, concluir-se, que também neste caso, como diz a tal lei de Gresham, a má moeda tomou o lugar de uma moeda que, se não era ainda boa, era, como se demonstra, bem melhor do que esta.
Tirar as ilações do passado importa sempre, especialmente quando ocorreram decisões com tantas consequências. Mas importa sobretudo para aquilo que as pessoas esperam de nós: sermos capazes de construir bem o presente e assegurar um bom futuro para Portugal. As eleições presidenciais encerram um ciclo. Mas também iniciarão outro.