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quarta-feira, abril 26, 2006

Apito dourado engolido

Do Público de hoje:

"Arquivadas parte das suspeitas contra Pinto da Costa e Valentim
Tânia Laranjo e António Arnaldo Mesquita

Decisão do DIAP do Porto abrange negócios do Metro e tráfico de influência
com governantes

As duas principais frentes do processo Apito Dourado, que motivaram, no início deste ano, a extracção de certidões para investigação, foram arquivadas pelo Departamento de Investigação e Acção Penal do Ministério Público do Porto. Designadamente as suspeitas de corrupção na empresa Metro do Porto e a alegada contrapartida com o pagamento do serviço de prostitutas que teria sido dada à equipa de arbitragem que apitou o jogo FC Porto-Estrela da Amadora.

Em dois despachos distintos, o Ministério Público conclui então que não há indícios de crimes cometidos por Pinto da Costa ou Valentim Loureiro. Ficam, assim, encerrados alguns capítulos do Apito Dourado, designadamente os que motivaram a detenção de Pinto da Costa e a suspensão de funções, enquanto administrador da empresa do Metro, de Valentim Loureiro.

As conclusões dos magistrados da 6.ª secção são então semelhantes nos dois inquéritos.

No que envolve Valentim Loureiro e onde, entre outras coisas, o procurador de Gondomar dizia haver indícios de tráfico de influências nas conversas mantidas com membros do Governo do PSD, o DIAP do Porto não "vislumbrou qualquer indício criminal". Também o mesmo aconteceu no caso de Pinto da Costa, nas investigações relacionadas com o jogo FC Porto-Estrela da Amadora.

O procurador do DIAP diz então que as escutas telefónicas envolvendo o presidente do FC Porto, o árbitro Jacinto Paixão e o empresário António Araújo nada provam, não havendo sequer indícios de que foi alterada a verdade desportiva. Aliás, diz ainda o magistrado, "qualquer pessoa que acompanhe semanalmente o futebol português teria de concluir que a arbitragem do Porto-Estrela da Amadora só teve pequenos casos quando comparada com muitos outros jogos", como foi o caso do FC Porto-Sporting deste ano, para a Taça de Portugal, arbitrado por Olegário Benquerença.

O magistrado acrescenta não estar demonstrada a existência de um nexo de causalidade entre a contratação de prostitutas e o resultado do jogo, tanto mais que "o interesse em comprar o jogo parece diminuto face ao posicionamento das equipas na tabela classificativa". As conversas telefónicas interceptadas entre António Araújo e Pinto da Costa também nada demonstravam, assegura o magistrado, já que os dois falaram sempre de um indivíduo chamado JP, que Carlos Teixeira, magistrado de Gondomar, garantia ser Jacinto Paixão, mas Pinto da Costa afirmava tratar-se de Joaquim Pinheiro. Também nunca se referiram claramente a mulheres, falando sempre em "fruta", o que Pinto da Costa disse querer significar dinheiro, já que o clube teria dívidas com António Araújo.

O Ministério Público do Porto arquivou igualmente os indícios de corrupção que envolviam Reinaldo Teles, vice-presidente do clube, e que levaram a que fosse também constituído arguido.

No caso de Valentim Loureiro e da Metro do Porto, o procurador adiantou que a única prova existente nos autos é que havia empréstimos do construtor Joaquim Camilo ao Boavista. Mas que esses empréstimos eram normais, assegurou, não sendo claro sequer em que qualidade é que Valentim Loureiro aparecia como avalista: se enquanto comerciante, se como ex-dirigente do clube ou se enquanto presidente da Metro do Porto.

O procurador diz depois que, sendo tais formas de financiamento habituais no mundo empresarial, não se vislumbra qual a contrapartida recebida por Valentim que pudesse configurar o crime de tráfico de influências e/ou corrupção.

Valentim e Pinto da Costa são alvo de outros processos em curso no âmbito do Apito Dourado."


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segunda-feira, abril 17, 2006

Democracia refrescante

No Público de hoje, José Lello (Secretário para as Relações Internacionais do PS), sobre as críticas que apareceram aquando a visita de Sócrates a Angola, presumivelmente relacionadas com a não observância de algumas regras democráticas básicas e dos direitos humanos naquele país, escreve coisas como:

"Angola precisa de tempo para fazer as suas reformas e ajustes económicos e sociais e para refrescar a sua normalidade democrática . Por isso, em muitas das opiniões que têm sido expressas, há boas doses de intolerância e de acinte.

...a parcialidade de quem jamais consegue distanciar-se de uma postura de interferência abusivana questões internas de Angola...

...cortinas de fumo que se pretendem lançar sobre Angola..."

Lello, que em boa hora foi afastado da pasta do desporto para que se propunha de novo (lá ia o Boavista ser campeão e florescer a indústria da nandrolona), continua em boa forma...
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sábado, abril 15, 2006

O Irão e a produção de energia eléctrica

Iran's nuclear achievements will place the Islamic Republic in a
position that forces countries which have not adopted a correct policy
toward Iran to overhaul their policies

Islamic Coalition Party Deputy Secretary General Asadollah Badamchian dixit!

É assim: ou fazes o que eu quero ou... produzo mais electricidade!
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sexta-feira, abril 14, 2006

Para o debate sobre a lei para os manuais escolares

Do parecer da Comissão Nacional de Educação:


Já o modelo proposto para o “regime de avaliação e de adopção aplicável aos manuais escolares dos ensinos básico e secundário” na Proposta de Lei suscita algumas dúvidas, mormente no que respeita à adequação desse modelo à finalidade que se quer prosseguir, finalidade essa que é a de assegurar uma melhor qualidade dos manuais escolares postos à disposição das famílias, dos alunos, das escolas e dos professores.

É que, concordando-se embora com a afirmação contida na Exposição de Motivos da Proposta de Lei de que “a generalização de uma cultura de avaliação das políticas, das organizações, dos agentes e dos recursos educativos constituirá certamente um poderoso instrumento para a promoção da qualidade”, importa ter em consideração que a avaliação prévia de manuais escolares, bem como de outros factores que convergem para o funcionamento do sistema escolar, para além da dificuldade intrínseca da própria avaliação, terá de fazer-se num quadro de apertados e sérios limites legais, de que se destacam os próprios princípios orientadores constantes da Proposta de Lei, os quais merecem inteiro apoio.

É o caso, designadamente, do princípio da liberdade de ensino, do princípio da autonomia científica e pedagógica na concepção dos manuais escolares, da liberdade e da autonomia dos agentes educativos, mormente dos docentes, na escolha e utilização dos manuais no âmbito do projecto educativo da escola, da liberdade de concorrência na produção, edição e distribuição dos manuais.

[...]

2 - Outro aspecto da Proposta de Lei que suscita reparo tem a ver com a estrutura concebida para levar a cabo a tarefa da avaliação, uma estrutura que se afigura pesada e de duvidosa eficácia.

[...]

prudente, por um lado, acautelar situações em que pode ser conveniente do ponto de vista pedagógico proceder à substituição do manual anteriormente adoptado e, por outro lado, ponderar as consequências da opção pela fixação de um período de tempo tão longo – 6 anos – ...
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Para o debate sobre a lei para os manuais escolares

A Comissão do Livro Escolar da Associação Portuguesa de Editores e Livreiros (CLE/APEL) vem, por este meio, e no seguimento de notícias publicadas na Comunicação Social, tornar pública a sua satisfação em relação ao parecer aprovado ontem pelo Conselho Nacional de Educação (CNE).

Com efeito, as notícias que dão conta da oposição do CNE ao Anteprojecto de Proposta de Lei para os Manuais Escolares são bem acolhidas pela CLE/APEL, nomeadamente no que concerne a uma eventual criação de um sistema de certificação prévia dos manuais escolares. Desde a apresentação do referido Anteprojecto que a CLE/APEL afirma que tal medida seria atentatória contra os princípios da liberdade de criação e edição de autores e editores, bem como da liberdade de escolha por parte dos professores.

Neste contexto, a CLE/APEL entende que o parecer aprovado pelo CNE é revelador de bom senso e de conhecimento sobre a matéria em causa, expressos em recomendações que serão certamente tidas em conta pelo Ministério da Educação.

Tal como a generalidade dos parceiros educativos, a Comissão do Livro Escolar da APEL defende uma cultura de promoção da qualidade na Educação em Portugal, e, no que concerne aos manuais escolares, isso é evidente na evolução registada ao longo da última década e meia. Contudo, entende que tal não pode ser feito em prejuízo dos princípios de liberdade acima enunciados, pois daí resultariam consequências extremamente negativas para o próprio sistema de ensino.

Assim, e na linha do comportamento que a caracteriza, a Comissão do Livro Escolar da APEL reafirma a sua inteira disponibilidade para definir um patamar de consenso no que concerne ao novo enquadramento legal para os manuais escolares.
Lisboa, 24 de Fevereiro de 2006
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quinta-feira, abril 13, 2006

Para o debate sobre a lei para os manuais escolares

Manuais adoptados pelas escolas vão ser válidos por seis anos
13.04.2006 - 16h47 PUBLICO, com Lusa

O Conselho de Ministros aprovou hoje o novo regime dos manuais escolares, que institui a sua certificação prévia por comissões de peritos e alarga para seis anos a vigência dos livros adoptados pelas escolas. O diploma prevê ainda que a gratuitidade dos manuais para os alunos mais carenciados.

Segundo o comunicado divulgado após a reunião, a proposta de lei visa criar "regras processuais que assegurem a conformidade dos manuais escolares com os objectivos e conteúdos dos programas ou orientações curriculares em vigor, promovam a elevação do seu nível científico-pedagógico e ao mesmo tempo proporcionem às famílias formas de utilização menos dispendiosas".

Uma das principais alterações do diploma, que tem ainda de ser discutida e aprovada no Parlamento, é a criação de uma sistema de avaliação dos manuais escolares antes da sua adopção pelas escolas – um processo que começará a ser aplicado a partir do ano lectivo de 2007/2008.

Assim, todos os editores terão de submeter os seus manuais a comissões de peritos (integrando docentes, investigadores, membros de associações pedagógicas e sociedades científicas), a quem caberá certificar os livros. O processo será supervisionado por um conselho de acompanhamento, a ser criado no âmbito do Conselho Nacional de Educação.

Com este sistema, a ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, diz ficar "assegurada a efectiva qualidade dos manuais escolares, garantindo a sua adequação ao currículo nacional e aos programas em vigor, assim como as regras de rigor científico e pedagógico".

Do universo de livros certificados, os docentes de cada escola ou agrupamento poderão de seleccionar os manuais que mais se adequam ao seu projecto educativo do respectivo estabelecimento.

Para garantir a transparência deste processo, a proposta de lei prevê a limitação das actividades de promoção desenvolvidas pelas editoras junto dos professores, que a ministra considera terem estado até agora submetidos a uma grande pressão.

O objectivo, segundo o Governo, "é pôr termo à muito preocupante desregulação do sector, que se traduziu numa proliferação de títulos no mercado, impossibilitando o efectivo controlo da qualidade por parte das escolas e dos docentes".
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Para o debate sobre a lei para os manuais escolares

No Público de hoje (colorido meu):

Carta aberta ao primeiro-ministro - as razões dos editores de livros escolares
Vasco Teixeira

Exmo. senhor primeiro-ministro

No fim-de-semana, tomámos conhecimento, através das declarações do secretário de Estado adjunto e da Educação, dr. Jorge Pedreira, publicadas na comunicação social, que o projecto de lei para os manuais escolares iria em breve a Conselho de Ministros para aprovação.

Perante esse cenário, entende a Comissão do Livro Escolar da APEL, Associação Portuguesa de Editores e Livreiros, dirigir a V. Exa., através desta carta aberta, um apelo para que impeça a concretização de um projecto que conduzirá o nosso sistema de ensino a um retrocesso de dezenas de anos.

De facto, o referido projecto de lei apresenta características que não só são desadequadas à realidade do nosso país, como impedirão a concretização da estratégia definida por V. Exa. para o desenvolvimento de Portugal. Falamos, naturalmente, do Plano Tecnológico e da modernização do país, para cujo sucesso é fundamental a promoção de uma educação virada para o futuro.

Ora, tal estratégia será seriamente posta em causa se for dada luz verde a um sistema centralizado e estatal de controlo prévio de qualidade dos manuais escolares e demais materiais auxiliares.

Um sistema que, por exemplo, obrigará a que os livros vigorem por oito anos - dois anos para a concepção, certificação e produção do livro escolar, mais seis anos de vigência no mercado -, pelo que, em 2015, os alunos estarão a estudar por manuais redigidos em 2006...

Além deste aspecto, é de sublinhar que os próprios argumentos do Ministério da Educação para justificar a definição de um novo enquadramento legal para os manuais escolares são nada menos do que falsos e infundamentados. Os responsáveis do ministério afirmaram várias vezes que este sector estaria desregulado e que os livros escolares em Portugal não são de qualidade.

Pois bem, esclareça-se que (i) o decreto-lei em vigor, o n.º 369/90, tem sido escrupulosamente respeitado por todos os agentes, incluindo os editores, à excepção do Ministério da Educação; (ii) não há um único estudo sério e rigoroso, publicado ou por publicar, que prove objectivamente que os livros escolares em Portugal não são de qualidade. Nenhum! Nem a actual equipa ministerial, em funções há mais de um ano, cuidou de produzir um só documento onde fossem apontadas deficiências a um qualquer manual.

Se há algo que se pode afirmar peremptoriamente em relação aos manuais escolares e outros materiais didácticos disponíveis no nosso país, é que estes apresentam uma evolução qualitativa inquestionável.

É importante que V. Exa. saiba, bem como toda a sociedade portuguesa, que as edições escolares têm sido responsáveis pela integração e difusão em Portugal de novas práticas educativas, nomeadamente as que recorrem à utilização de novas tecnologias, com o necessário rigor científico e pedagógico, respondendo de forma competente às necessidades e expectativas de alunos e professores.

Há um conjunto de factores que contribuem para esta realidade: desde logo, o investimento contínuo dos editores portugueses nas áreas da formação e investigação; a aposta no trabalho de autores e consultores de reconhecida competência nas respectivas disciplinas; a colaboração dos mais reputados professores universitários, pedra-de-toque num processo exigente e criterioso que, como se constata, resulta, na prática, num sistema de auto-regulação de provas dadas.

O próprio Ministério da Educação tem beneficiado em muito do trabalho desenvolvido pelos editores escolares, nomeadamente em iniciativas que visam o apoio a alunos com necessidade educativas especiais, a promoção da utilização das novas tecnologias nas escolas, o combate ao insucesso escolar.

Ao longo dos anos, os editores escolares têm apoiado o ministério em inúmeros programas de elevado mérito socioeducativo, sem exigir contrapartidas, numa lógica de responsabilidade social que, pese embora não seja do conhecimento de todos, consideramos injusto desconsiderar.

Ainda assim reconhecemos, com toda a naturalidade e transparência, que ainda há aspectos a melhorar, mas em abono da verdade lhe dizemos que a maioria das supostas deficiências apontadas a alguns manuais são tão-somente a prova de que os respectivos programas curriculares não correspondem ao desejável.

Não são só os editores que o afirmam: professores e especialistas nas mais diferentes áreas têm vindo a público criticar os programas em vigor, os mesmos pelos quais autores e editores são obrigados a elaborar os manuais escolares.

A visita de V. Exa. à Finlândia foi acompanhada pelos editores escolares com particular interesse e foi com enorme satisfação que constatámos a admiração por si manifestada quanto ao modelo educativo finlandês. Essa satisfação deve-se ao facto de há muito acompanharmos atentamente a realidade finlandesa, bem como a de outros países de notório sucesso educativo, caso da Noruega, Holanda, Suécia, Espanha, França, Itália, entre outros, o que tem contribuído para que as edições escolares portuguesas reflictam também o que de melhor se faz ao nível da educação nesses países.

No entanto, é muito importante que todos saibam que, nesses mesmos países, o controlo da qualidade dos manuais é exercido pelos professores, a quem se exige profissionalismo e responsabilidade pelas escolhas. Nesses países, que apresentam os mais elevados índices de sucesso educativo, não vigoram sistemas de certificação prévia, estatizados e centralizados, por tal ser entendido como contraproducente.

Não se compreende, pois, o porquê de se querer impor no nosso país um sistema absolutamente inadequado e retrógrado. Mais incompreensível se torna porque se vive o momento em que se exige a modernização da Educação em Portugal através da integração das novas tecnologias, da promoção da autonomia das escolas e consequente diminuição do peso do Estado central, e da responsabilização dos diferentes agentes educativos.

Numa altura em que a maioria dos países europeus tenta seguir o exemplo da Finlândia, investindo na ligação das salas de aula à Internet e, assim, permitindo a utilização de imensos recursos por parte de professores e alunos, o Ministério da Educação parece querer trilhar o caminho inverso. Em vez de motivar os professores e os órgãos de gestão das escolas para seleccionarem com rigor e exigência os materiais didácticos que os seus alunos vão usar, preparam-se para eternizar o uso de materiais escolhidos por três ou cinco especialistas com reduzido conhecimento da realidade das escolas e, sobretudo, dos alunos.

Ao subalternizar e afastar os professores do processo de selecção de manuais, o Ministério da Educação está a desmotivá-los, obrigando-os a trabalhar com materiais que não foram escolhidos por eles nem tão-pouco serão os mais rigorosos e adequados para os respectivos alunos. O impacte negativo que esse cenário terá na leccionação afigura-se, pois, enorme.

Creia, senhor primeiro-ministro, que nos move muito mais do que quaisquer interesses empresariais, ainda que tal fosse legítimo. Os nossos argumentos evidenciam uma preocupação sincera pela salvaguarda das necessidades dos alunos e do país, a mesma que nos tem motivado a aceitar o congelamento dos preços dos manuais escolares que vigora há quatro anos e que partiu da nossa iniciativa.

Não é, pois, de ânimo leve que afirmamos que a criação de comissões de certificação prévia de manuais escolares resultará em incalculáveis prejuízos para o nosso sistema de ensino. Haja bom senso para que se evite esse cenário, em nome dos alunos que constituem o futuro do país.

Comissão do Livro Escolar da Associação Portuguesa de Editores e Livreiros
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quarta-feira, abril 12, 2006

Angola Portugal

No Público de hoje:

Jornal de Angola e Angop atacam Estado português
Maria José Oliveira

Editorial anónimo critica cobertura jornalística da visita
de Sócrates a Angola
e fala em "fantasmas
do colonialismo"

O Jornal de Angola e a agência de notícias Angop, ambos órgãos de informação estatais, criticaram violentamente o Estado português aludindo implicitamente ao processo Casa Pia e apontando a existência de uma "lista dos corruptos" que "crescem como cogumelos".

Intitulado "As feridas da liberdade", o texto, não assinado, serviu de editorial à edição de ontem do diário angolano e foi colocado em linha pela agência de notícias na secção de Política. Apresentando-se como uma réplica ao "coro de insultos" e a "toda a espécie de mentiras" alegadamente desencadeados pela comunicação social portuguesa na cobertura da visita do primeiro-ministro José Sócrates a Angola (de 4 a 7 deste mês), o artigo destaca: "Nenhum jornalista angolano, nenhum comentador, nenhum líder de opinião lembrou à comitiva portuguesa que o direito ao emprego faz parte do elenco dos direitos humanos. Ninguém se lembrou de invectivar os governantes portugueses por terem permitido que crianças à guarda do Estado português tivessem sido abusadas sexualmente. Ninguém fez a lista dos corruptos que, segundo magistrados portugueses, crescem como cogumelos à sombra do aparelho de Estado e estão a exaurir a riqueza de Portugal." E questiona: "O que aconteceria em Portugal se o tivéssemos feito?"

Sócrates não comenta

O PÚBLICO contactou o gabinete de José Sócrates para tentar obter uma reacção a estas acusações, mas o assessor de imprensa do primeiro-ministro, David Damião, disse desconhecer o texto em causa. Apesar disso, adiantou a recusa de Sócrates em fazer qualquer comentário. Carneiro Jacinto, assessor do ministro dos Negócios Estrangeiros, remeteu esta matéria para o gabinete do primeiro-ministro, lembrando que o artigo foi publicado na sequência da visita de Sócrates a Angola.

O PÚBLICO tentou igualmente contactar o adido de imprensa da embaixada de Angola, Ramiro Barreira, mas tal não foi possível até à hora de fecho desta edição.
O texto começa por notar que a visita de Sócrates "foi um êxito", para depois atacar a cobertura jornalística portuguesa, que, pode ler-se, é tributária dos "fantasmas do colonialismo", do "racismo" e da "ignorância". Quanto aos "líderes de opinião" que têm desenvolvido uma "campanha caluniosa", lê-se, é somente nomeado José Manuel Fernandes, director do PÚBLICO, que "sem nunca ter posto os pés" em Angola "destila em forma de escrita canhestra opiniões fundadas na ignorância e na provocação".

Na passada sexta-feira, José Manuel Fernandes escreveu um editorial titulado "O outro lado de Angola", no qual criticava o facto de a visita de Sócrates não incluir na sua agenda o tema dos direitos humanos. Na mesma edição, foram publicados textos que davam conta de casos de violação dos direitos humanos, com destaque para situações verificadas no enclave de Cabinda.
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O Supremo e os correctivos corporais

No Público de hoje:

Supremo diz que são lícitos "correctivos" corporais dados a crianças deficientes
12.04.2006 - 07h38 : Tânia Laranjo (PÚBLICO)

O Supremo Tribunal de Justiça considerou como "lícito" e "aceitável" o comportamento da responsável de um lar de crianças com deficiências mentais, acusada de maus tratos a vários menores.

A mulher tinha sido indiciada por diversas situações: daria palmadas e estaladas às crianças, fechá-las-ia em quartos escuros quando estas se recusavam a comer. Foi condenada por apenas um caso (o tribunal considerou que, pelo menos por duas vezes, amarrou os pés e as mãos de um menino de sete anos, como forma de evitar que saísse da cama e perturbasse o seu sono), tendo sido condenada com pena suspensa.

O Ministério Público recorreu, mas não lhe foi dada razão. O Supremo disse, aliás, que fechar crianças em quartos é um castigo normal de um "bom pai de família". E que as estaladas e as palmadas, se não forem dadas, até podem configurar "negligência educacional".

"Qual é o bom pai de família que, por uma ou duas vezes, não dá palmadas no rabo dum filho que se recusa ir para a escola, que não dá uma bofetada a um filho (...) ou que não manda um filho de castigo para o quarto quando ele não quer comer? Quanto às duas primeiras, pode-se mesmo dizer que a abstenção do educador constituiria, ela sim, um negligenciar educativo. Muitos menores recusam alguma vez a escola e esta tem - pela sua primacial importância - que ser imposta com alguma veemência. Claro que, se se tratar de fobia escolar reiterada, será aconselhável indagar os motivos e até o aconselhamento por profissionais. Mas, perante uma ou duas recusas, umas palmadas (sempre moderadas) no rabo fazem parte da educação", dizem os juízes, num acórdão proferido na semana passada.

Tribunal deu como provadas diversas agressões

O caso: a arguida era a responsável pelo lar residencial do Centro de Reabilitação Profissional, uma instituição que funcionava como valência da Associação de Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental de Setúbal. O tribunal deu como provado que, entre 1990 e 2000, a arguida trabalhou naquele lar e que pelo menos desde 1992 fechou frequentemente um menor de sete anos (que sofria de psicose infantil muito grave) na despensa, com a luz apagada, para que aquele ficasse menos activo.

Também foi dado como provado (e validado pelo Supremo) que a referida educadora pelo menos duas vezes "amarrou os pés e as mãos do B [do menor] à cama para evitar que acordasse os restantes utentes do lar e para não perturbar o seu descanso matinal".

Dizem ainda os juízes que a arguida dava frequentemente bofetadas à mesma criança e que, "por uma ou duas vezes, deu palmadas no rabo a outra menina quando não queria ir para a escola e uma vez deu uma bofetada a outro [menor] por este lhe ter atirado com uma faca".

Os mesmos tribunais (o de Setúbal e o Supremo) consideraram ainda que se tinha provado que um quarto menor deficiente ficou "de castigo num quarto sozinho quando não quis comer a salada à refeição, tendo aquele ficado a chorar por ter medo". Mesmo assim, disseram os juízes que era tudo normal e que não se podia falar de comportamento reiterado.

Mulher trabalhava sem folgas

A argumentação do Ministério Público, que defendia tratar-se de "tratamento cruel" às crianças, não foi dada como válida, nem-tão pouco a existência do crime de maus tratos.

"A gravidade inerente às expressões maus tratos e tratamento cruel constitui, ela sim, o elemento que nos leva à improcedência deste recurso. É que, quanto a estes menores, não só não se atinge tal gravidade, como os actos imputados à arguida devem, a nosso ver, ser tidos como lícitos. Na educação do ser humano justifica-se uma correcção moderada que pode incluir alguns castigos corporais ou outros. Será utópico pensar o contrário e cremos bem que estão postas de parte, no plano científico, as teorias que defendem a abstenção total deste tipo de castigos moderados", concluem os juízes, mantendo então a pena aplicada pelo tribunal de primeira instância à arguida, por ter amarrado os pés e as mãos da criança: dezoito meses de prisão, suspensos por um ano.

O tribunal teve ainda em consideração, na pena que aplicou, o facto de a arguida não ter cadastro, nem agora estar a tomar conta de crianças. Outra atenuante foi ter-se provado que trabalhava sem qualquer dia de folga, o que terá levado a juíza de instrução a considerar, segundo o recurso também apresentado pela defesa, que seria a arguida, e não as crianças, a verdadeira "vítima de maus tratos".


Com estes trogloditas a administrar justiça não admira que os pedófilos andem à solta, é tudo muito normal e educativo...


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domingo, abril 09, 2006

Sobre o "Eduquês" de Nuno Crato

Desidério Murcho ontem no Público:

Educação para uns, jogo do pau para os outros


Ao contrário do que o título deste pequeno livro pode fazer pensar, não se trata felizmente de mais um panfleto contra o desastrosamente chamado "eduquês". É antes uma contribuição - reflectida, distanciada e séria - para um debate que geralmente é apenas panfletário. Ao longo de treze curtos capítulos, Nuno Crato expõe os fundamentos teóricos das ideias que têm marcado o sistema educativo português nas últimas duas décadas. Para quem trabalha em concreto no ensino, contactando com sucessivos ministérios, programas, legislações e professores, a abordagem de Nuno Crato pode parecer dar demasiada substância e seriedade teórica ao que não passa de um conjunto de medidas ministeriais avulsas, confusas e irresponsáveis. Contudo, esta impressão seria errada.

Como Nuno Crato procura mostrar, os modelos educativos seguidos nos últimos anos pelos responsáveis ministeriais respondem a ideias pedagógicas perfeitamente identificáveis - e que há muito os melhores especialistas da área sabem estar erradas. Assim, é muitíssimo importante apresentar tais ideias, mostrar por que razão estão erradas, e apresentar alternativas.

Nuno Crato documenta amplamente as ideologias educativas defendidas pelos responsáveis ministeriais ao longo dos anos - responsáveis que se caracterizam pela vagueza de ideias, incapacidade para articular raciocínios explícitos, completa ignorância científica das áreas sobre as quais legislam impunemente (Matemática, Filosofia, Português, História, Física), uso ideológico do ensino (o Ministério da Educação cumpre hoje as funções do extinto Ministério da Propaganda), desconhecimento das teorias educativas actuais em ciências da educação e uso prepotente do poder ministerial.

As ideologias educativas dos responsáveis ministeriais têm alguns aspectos marcantes: profundo desprezo pelo conhecimento "escolar", considerado elitista e gerador de exclusões sociais, com a consequente exclusão progressiva de conteúdos das diferentes disciplinas (da Matemática à Filosofia, da História ao Português); ênfase na motivação mentecapta dos estudantes (tudo serve para animar a malta: brincadeiras, CD-ROM, visitas de "estudo", etc.) e na ideia de que o estudante cria o seu próprio currículo e reconstitui por si, em doze anos de escolaridade, as descobertas que à humanidade custaram séculos de esforço colegial constante; aversão à avaliação externa (os exames nacionais, depois de reintroduzidos pelo ministro David Justino, são novamente desvalorizados, cuidadosamente e pela calada, pelo novo ministério, que de socrático só tem o nome).

O aspecto fundamental que explica o estado actual de coisas é exposto por Nuno Crato ao citar Ana Benavente: "Os modelos escolares dominantes de "cultura", de "saber", de "sucesso", de "bom aluno", o modelo dominante de escola, afinal, criam dificuldades e constituem obstáculo ao sucesso dos alunos que pertencem a meios de cultura não letrada" (pág. 31). A análise de Ana Benavente está parcialmente correcta, mas é ambígua, e dela os responsáveis ministeriais retiram estratégias educativas erradas. O que se passa é que a escola não sabe ensinar quem não vem ensinado de casa e quem não traz de casa fortes motivações para estudar.

Este problema não se punha antes do 25 de Abril, porque só os filhos dos privilegiados chegavam à escola. Hoje, quando chegam à escola os filhos de quem nunca leu um livro, esta não sabe motivá-los para um universo que lhes é estranho. O diagnóstico está, pois, correcto.

Mas a solução errada - monstruosamente errada - dos sucessivos responsáveis ministeriais baseia-se na crença falsa de que os filhos dessas pessoas não podem interessar-se por astronomia, química, literatura ou filosofia. Assim se chegou à ideologia educativa hoje oficial, segundo a qual os negros, por exemplo, não podem interessar-se por física quântica porque isso é só para filhos de universitários, os ciganos não podem interessar-se por violino porque isso é só para filhos de médicos, etc. Logo, para que estas crianças, coitadinhas, possam ter "sucesso", temos de os ocupar e motivar com o jogo do pau e o Big Brother da TV (o de Orwell não, claro) - a física não é para eles, coitadinhos. É esta crença falsa - além de classista, racista e repugnante - que orienta e explica as políticas dos sucessivos ministérios da Educação.

Acontece que os filhos dos privilegiados não são mais espertos do que os outros; apenas têm em casa o que os outros não têm: livros e o apoio dos pais. O papel do sistema educativo não é decidir à partida que tais crianças estão perdidas para a física quântica ou o violino ou a filosofia, mas antes dar-lhes na escola o apoio e o estímulo que não têm em casa, para que passem a valorizar o conhecimento e possam descobrir vocações. A prática e os resultados dos muitos professores de altíssimo profissionalismo e dedicação que temos no país não deixa lugar para dúvidas: a melhor estratégia de motivação das crianças culturalmente mais desfavorecidas é a solidez científica dos conteúdos, a clareza das explicações, a adequação do vocabulário, o rigor da avaliação, o estímulo ao pensamento crítico e à compreensão activa. Como escreve Nuno Crato:

"Os bons professores sabem o que se deve fazer e tentam fazê-lo. Se às vezes não o fazem mais e melhor, essa limitação não se lhes deve. Deve-se sim às imposições avulsas do ministério, aos currículos desconexos, aos maus manuais escolares, a um ambiente de desrespeito pela cultura e pela educação" (pág. 121).

Este livro é urgente, é importante, é fundamental. Enquanto Nuno Crato e outros professores e intelectuais deste calibre não tomarem as rédeas da educação no nosso país, continuaremos um país rasca - bom para poucos, mas à custa de muitos.

O Eduquês em Discurso Directo: Uma Crítica da Pedagogia Romântica e Construtivista
AUTOR Nuno Crato
EDITOR Gradiva
131 págs., 9,00 euros
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sábado, abril 08, 2006

Liberdade e Educação

No Público de hoje:

Enfrentar o desafio da reforma da educação no Reino Unido e... em Portugal

Francisco Vieira e Sousa

o mês passado, o primeiro-ministro inglês conseguiu impor ao seu partido a aprovação da reforma educativa proposta no livro branco intitulado Melhor Qualidade, melhores Escolas para Todos ­- Mais Escolhas para os Pais e para as Escolas, que, em conjunto com a ministra da Educação, Ruth Kelly, vinha promovendo desde Outubro.

Digo "conseguiu impor", porque o debate final em sede parlamentar, não obstante a justeza das propostas, não evitou a tradicional querela partidária do posicionamento ideológico entre esquerda e direita, com uma parte significativa do Partido Trabalhista a votar contra.

A ideia-força da reforma de Blair é a de que a forma mais eficaz de assegurar níveis educativos de qualidade e melhores escolas para todos é garantir a escolha da escola pelos pais. De facto, no essencial, as medidas preconizadas têm como objectivo possibilitar a todas as famílias a escolha da escola a frequentar pelos seus filhos. Entre estas destacam-se o financiamento público às escolas privadas que prestem o serviço público de educação, o incremento da autonomia das escolas estatais, o transporte gratuito dos alunos que têm menores recursos económicos para a escola da sua escolha, desde que situada a menos de dez quilómetros da residência, a introdução de um serviço local de promoção e apoio à escolha dos pais menos informados e o posicionamento das autoridades centrais e locais como garante da qualidade e da equidade do sistema e não como prestadores propriamente ditos do serviço de educação.

Para muitos, tudo isto parece novidade, mas a verdade é que Tony Blair não está "a inventar a roda". Esta reforma vem no seguimento de uma anterior abertura do sistema a uma sã concorrência entre prestadores do serviço público de educação, lançada em 1997, e segue de perto as mudanças que outros países, especialmente os escandinavos, têm vindo a pôr em prática desde a última década do século passado. A Europa, ou parte dela, percebeu que os seus sistemas de ensino nacionais, criados centralmente para responder à necessidade de estender a educação a toda a população, não seriam capazes de responder às exigências da sociedade de informação emergente. O modelo seguido até então, que havia permitido vencer o desafio da quantidade, revelava-se incapaz de ultrapassar o desafio da qualidade, de tal modo que o insucesso escolar crescia e o topo da classificação dos indicadores educativos internacionais começava a ser dominado por países asiáticos.

A reforma de Blair visa transformar a actual estrutura rígida e burocratizada do serviço público de educação numa estrutura flexível, onde a inovação e a capacidade criativa não sejam a excepção, mas a regra, proporcionando a todos o acesso a um ensino de maior qualidade, mais próximo da realidade de cada aluno e da sua comunidade educativa. Para tal, propõe-se, por um lado, dar expressão real à capacidade (e direito) dos pais escolherem a escola que consideram ser mais adaptada para os seus filhos e, por outro, utilizar um bem valioso, até agora menosprezado, que é a energia dos cidadãos, pais, professores, associações, igrejas, fundações, empresas, etc., abrindo o sistema educativo a todos os actores locais que desejem contribuir com o seu esforço e sabedoria, desde que cumpram certos requisitos do serviço público de educação.

Os opositores à mudança, supostos guardiães da igualdade, agitam três fantasmas ideológicos que a queda do Muro de Berlim deveria ter enterrado definitivamente: (1) o favorecimento das classes dominantes, afirmando que um sistema assim seria gerador de grande iniquidade, com os alunos provenientes de meios familiares economicamente favorecidos a frequentar as melhores escolas; (2) a superioridade moral do Estado, na suposta incapacidade dos pais de saberem escolher a escola dos filhos, ou podendo, não conseguirem tornar essa escolha efectiva; (3) a perfídia do mercado e da iniciativa privada, uma vez que a competição entre escolas seria prejudicial ao seu funcionamento, principalmente se parte das escolas fosse gerida ou detida por entidades privadas, preocupadas com a minimização dos custos e apenas animadas pelo lucro.

Acontece que o diagnóstico traçado pelo livro branco inglês acerca do seu sistema educativo não difere muito dos múltiplos diagnósticos que por cá se fazem. Quando muito, estará em causa o grau, que não a categoria das deficiências identificadas. Lá, como cá, "o diferencial na frequência entre escolas com elevados índices de sucesso e escolas com baixos resultados é demasiado grande". Lá, como cá, "os resultados educativos das crianças ainda estão intimamente ligados ao estatuto económico e social de seus pais", tornando-se um entrave à promoção cultural e social dos mais pobres.

Tony Blair teve a seriedade intelectual e a coragem política de dizer ao povo inglês aquilo que em Portugal muitos também começam a dizer em voz baixa, mas os cânones do politicamente correcto impedem muitos outros de afirmar em voz alta: que só a liberdade de educação, incluindo de escolha da escola, é capaz de garantir a igualdade de oportunidades de educação. Para os alunos mais pobres, "uma escola igual para todos" significa frequentemente uma escola esquecida e sem qualidade; em contrapartida, o actual sistema acaba por beneficiar os alunos provenientes de famílias mais favorecidas, quer recorrendo a formalismos em que os centralismos burocráticos são prólogos, quer escolhendo viver na vizinhança das escolas melhores, quer optando por escolas não estatais.

A garantia de liberdade de educação para todos é a única forma de defender e promover a igualdade de oportunidades de educação com qualidade para todos. Este deveria ser o princípio estruturante de qualquer reforma educativa em Portugal, a partir do qual a mudança brotaria sem dor, a partir de cada realidade. Com efeito, num sistema educativo constituído de igual forma por escolas estatais e não-estatais com ampla autonomia, em que imperasse a possibilidade de escolha dos pais, as aulas de substituição, o prolongamento dos horários escolares ou a estabilização do corpo docente seriam uma realidade há muito, sem qualquer necessidade de imposição superior. Nas palavras de Tony Blair, trata-se de "garantir que as melhorias se tornem auto-sustentadas no interior das próprias escolas, com as escolas e os pais a determinarem e conduzirem a mudança".

A José Sócrates e a Maria de Lurdes Rodrigues pede-se, pois, a coragem de avançar com idêntica reforma, para que também Portugal consiga níveis educativos de qualidade e melhores escolas para todos.

Militante socialista e membro do Fórum para a Liberdade de Educação
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quinta-feira, abril 06, 2006

Sobre o "Eduquês" de Nuno Crato

Vasco Graça Moura, ontem, no DN:

Comecei tarde a ler os artigos de Nuno Crato no Expresso. O que me chamou a atenção, aqui há uns meses, foi um texto que ali publicou sobre o número de ouro. Em 1985, eu tinha tentado demonstrar a relevância estrutural da divina proporção para as redondilhas "Sobre os rios que vão", de Camões, e aquele texto abordava os mesmos princípios com uma clareza notável. Agora, acabo de ler de um fôlego o seu livro, que atingiu rapidamente a segunda edição, O 'Eduquês' em discurso directo/Uma crítica da pedagogia romântica e construtivista (Gradiva, 2006). Diga-se desde já que esta obra presta um serviço público inadiável e devia ser de leitura obrigatória para todos os responsáveis pela educação em Portugal, dos membros do Governo aos pais dos alunos, passando, evidentemente, pelos professores e pelos sindicalistas do sector.

Numa linguagem muito simples e directa, o autor desmonta as sucessivas e inenarráveis patetices e irresponsabilidades que têm dominado as teorias pedagógicas e os programas de ensino em Portugal e que explicam, em grande medida, o insucesso escolar e a bronca iliteracia dos nossos estudantes.

O discurso directo do "eduquês" que Nuno Crato analisa atinge as raias do delírio surrealista, configurando as justificações ideológicas mais insensatas, a cegueira mais portentosa perante a realidade, a exaltação abominável de teorias mais do que ultrapassadas em toda a parte menos por estas paragens em que se continua a "entre-enxertar" impavidamente o pior de Rousseau, de Piaget e de Agostinho da Silva…

Entre muitos possíveis, eis um exemplo, dado a pp. 57-58: "A função principal [do professor] já não é dar o programa, mas interpretar, gerir e adaptar o currículo às características e necessidades dos alunos". Eis outro, este ainda mais alçapremado, a p. 109: "O professor deverá respeitar sempre a opinião do aluno e, mesmo quando esta é incorrecta, evitará emitir sobre esta um juízo de valor."

Vai para cinco anos, citei aqui um manual de português deveras suculento para o 11.º ano onde se lê que "não se deve: comentar o texto; analisar as atitudes e as acções das personagens; dar opiniões; omitir detalhes funcionais; ir para além do texto". Mas agora estas pérolas surgem a propósito do ensino da matemática e da aritmética!

Um parágrafo do livro pode servir expressivamente de síntese geral: "Na realidade, disciplinas tão fundamentais como a literatura, a matemática e a filosofia podem ser essenciais para preparar um jovem para o mercado de trabalho. Por essa razão, os programas das universidades anglo-saxónicas concentram-se em áreas básicas. A tentação portuguesa, pelo contrário, tem sido a de estreitar conteúdos, orientando-os para as aplicações e escolhendo de forma bastante arbitrária aquelas que se imagina serem importantes" (p. 68).

Questões como as da disciplina; da autoridade do professor; do inefável princípio do prazer; da vantagem dos exames; da configuração (e da destruição que se vai operando) dos currículos; da moda da chamada "contextualização das aprendizagens"; da memorização (tão dramaticamente desvalorizada pela escola portuguesa); da tabuada; da retórica balofa do "eduquês" a propósito dos conteúdos; do vazio angustiante do Currículo Nacional do Ensino Básico: Competências Essenciais, o qual "desliga e coloca em oposição a criatividade e a aprendizagem de rotinas" (p. 83); das dificuldades na apreensão de conceitos; da rejeição da fase dogmática que, no ensino, precede necessariamente toda a fase crítica - são outros tantos pontos em que o leitor, face ao que se passa na escola portuguesa, oscila constantemente entre o pasmo, a indignação e a revolta.

Nas conclusões, e citando Diane Ravitch, Nuno Crato acentua que "no século XX tudo o que se apresentou como movimento de mudança radical da escola deveria ter sido evitado como uma praga".

Já falei várias vezes do "eduquês" nesta coluna. Agora, num artigo do último Expresso, Guilherme Valente, editor do livro, cita amplamente um eminente professor de Matemática francês, Laurent Laforgue, para quem querer resolver o problema da educação recorrendo aos especialistas dela seria o mesmo que querer defender os direitos do homem recorrendo aos khmers vermelhos. Não se podia dizer melhor. Entre a vergonha e a catástrofe, devemos reconhecer que é isso mesmo. A senhora ministra da Educação fará aos contribuintes o subido obséquio de ler atentamente este livro.

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